domingo, 16 de novembro de 2008

Fenómeno deflacionário

Numa discussão no Caldeirão foi feita a seguinte pergunta:
Um acontecimento que sempre me causou estupefacção é o fenómeno deflacionário.

A minha questao é: se um governo assim o desejar, e poder decidir a sua politica monetária (taxa de juro e emissao de moeda), nao consegue reverter facilmente esta situação?


Tentei responder da melhor forma e aqui fica então o esclarecimento para os leitores do blog

Imaginemos que uma laranja custa 10 euros. Existe aí uns quantos tipos espertos que acham que a procura dos próximos anos vai exceder a oferta e decidem comprar laranjas antes do tempo (através de um qualquer instrumento financeiro, e.g. futuros). Mas nestas coisas usa-se sempre um bocadinho de alavancagem.

Conforme o tempo passa mais investidores aderem à compra de laranjas, ou porque seguem a tendência ou porque tiraram as mesmas conclusões que os primeiros tipos, ou porque simplesmente gostam de laranjas. Conforme se fazem mais compras a crédito (alavancagem) mais se expande a massa monetária que tende a inflacionar o preço da laranja, neste caso não só devido à procura/oferta mas também porque efectivamente há mais dinheiro atrás da mesma produção da laranja.

O preço das laranjas dispara como é óbvio e numa economia eficiente haverá mais agricultores a dedicarem-se às laranjas para aproveitarem melhor o seu capital. Estes agricultores pagarão mais aos seus funcionários para garantirem mão de obra suficiente na apanha da laranja e por aqui começa-se a dispersar o capital fabricado através do crédito na economia real.

Ao fim de algum tempo (uns anitos que estas coisas demoram) a oferta excederá a procura e eventualmente o preço terá de baixar.

O cenário agrava-se porque não só o excedente de laranjas faz baixar o preço como as posiões alavancadas que serão fechadas, seja por opção ou porque o prejuízo da posição a isso obriga. O dinheiro então criado passou a ser destruído e passa efectivamente a haver menos dinheiro a procurar essas mercadorias.

Entretanto os agricultores não conseguem suportar os custos que estão inflacionados, o seu capital real foi também diminuido pelo investimento que fizeram nas terras e pelos salários mais altos com que se compremeteram e como não poderão vender por muito tempo as laranjas abaixo do seu preço de produção sem que abram falência começa por aqui a deflação a entrar na economia real. Reduçáo de produção, emprego, investimento, etc.

É fácil de ver porque é que os governantes preferem a inflação à deflação, mas também não é muito dificil de ver a capacidade destrutiva da inflação quando faz com que o capital seja alocado a industrias que não o deveriam ser, sejam laranjas ou casas de habitação.

É certo que visto que o dinheiro é só papel (ou bits no computador lá do banco) o Governo o poderia fazer reaparecer, mas os mecanismos pelos quais isso se faz é através da dívida publica e levanta-se a questão se será justo que todos os cidadãos fiquem individados como resultado das acções de apenas um pequeno grupo. Mais... o dinheiro pode ser criado mas não há garantias que vá parar à industria da laranja, pode ir parar às maçãs o que além de não resolver o problema das laranjas arriscava-se a criar um problema semelhante numa outra industria. E enquanto isto o capital real vai sendo dizimado e trocado por promessas de capital futuro (dívida) o que é bastante diferente.

Também se pode notar que apesar de o papel destrutivo ser da inflação normalmente é a deflação que leva com as culpas todas pois é apenas quando esta surge que os problemas se tornam visiveis.

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