sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Repensar a produtividade

Artigo original do Vida Económica:

A produtividade está na ordem do dia. A sociedade tem-se desdobrado em múltiplos debates sobre a matéria e o culminar desses debates está à porta com uma nova lei geral do trabalho. Confesso que o que mais me irritou nestes debates foi a ligeireza com que alguns argumentos foram expostos e como os casos são tratados. Quem não estiver mais atento fica com a sensação de que os trabalhadores portugueses são a raiz de todos os males e ignora por completo as responsabilidades dos gestores de topo e dos investimentos que podem ser feitos para melhorar o trabalho de todos. É preciso ter presente que a produtividade se mede com uma fórmula muito simples (Produtividade = Riqueza Produzida a dividir pelo custo de produção) e que para conseguirmos resultados durardouros devemos conseguir mexer em ambos os pontos da equação. Somente reduzirmos os custos de produção nunca poderá ser solução única a não ser que a esperança seja que eles tendam para zero.

É aqui que a tecnologia pode dar uma ajuda, mantendo o custo de produção mas aumentando a quantidade produzida. Para isto não basta colocar um computador em cada secretária da nossa empresa e dizer que estamos na nova era tecnológica. Passarmos toda a burocracia existente para um ficheiro não aumenta a produtividade, apenas representa custos de formação para quem estava habituado às folhas de papel da “antiga economia”. É preciso saber concentrar a informação, dispensar o supérfluo. Se não precisarmos de escrever a mesma informação em 3 documentos distintos então podemos escrever 3 vezes mais documentos mas isto não se faz apenas com a migração dos documentos para formato digital... É preciso aproveitar a oportunidade para redesenhar todo o fluxo de circulação da informação pela empresa.

O primeiro caminho a seguir será nas industrias tradicionais, como a textil ou do calçado, focar os investimentos em tecnologia que mude radicalmente a estrutura da empresa. O investimento terá que ser centrado na aquisição de nova infra-estrutura – maquinaria que permita que o empregado já existente passe a produzir mais unidades por hora trabalhada.

A segunda via será melhorar e gerir os processos de produção. Dando o exemplo na indústria de software é urgente investir em departamentos de qualidade de software capazes de determinar e avaliar o processo de implementação passo a passo que trará uma enorme vantagem competitiva na altura de corrigir defeitos presentes ou implementar novos pedidos do cliente. Em Portugal, ainda muitas empresas das “novas tecnologias” sobrevivem sem responsáveis por estas áreas e isso ressente-se quando é preciso fazer qualquer tipo de alteração a um produto que já está no cliente final, é demoroso encontrar a falha e muitas vezes é simplesmente infernal tentar corrigi-la sem que se introduzam novos defeitos... As horas de trabalho que são perdidas nestes processos e que poderiam facilmente ser evitadas com respnsáveis de qualidade e Change Management são entraves à produtividade que não aparecem nas estatísticas. É aliás este um dos maiores problemas no debate da produtividade: as melhorias que podem ser feitas estão muitas vezes escondidas e é necessário uma revisão contínua dos métodos de trabalho para irmos mais além.

Por fim, podemos apostar na qualidade. Não apenas porque o que é bom vende melhor mas principalmente porque o que é bom vende mais caro. Imaginemos que éramos um país que não produzia mais nada a não ser canetas descartáveis. Se do dia para a noite passássemos a produzir canetas de alta qualidade, a produtividade disparava sem que ninguém trabalhasse mais 5 minutos por dia por causa disso (apenas porque existe uma maior margem de lucro).

Penso que é nestes casos que a classe política, mas principalmente os gestores de topo das empresas portuguesas, terão que se focar para encontrar melhorias segnificativas nos próximos anos. Tentarmos todos, quando discutimos a produtividade da nação e da nossa empresas, olhar para a primeira parte da equação da produtividade em vez de vivermos obcecados com os custos de produção (que obviamente são sempre uma componente importante) como se alguma vez pudéssemos competir com a China ou com a Índia a esse nível.

Podemos pois aumentar a produtividade dos portugueses fazendo-os trabalhar mais ou fazendo-os trabalhar melhor, sendo certo que a primeira hipótese nos dará a ilusão de podermos competir com as economias emergentes enquanto a segunda será o caminho para um crescimento sustentado a longo prazo.

Nuno Branco

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