sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Sobre o tempo que nos resta

Nos últimos dias troquei algumas impressões por e-mail com um dos leitores aqui do Inflaccionista, sobre o Estado do país, de formas de controlar a despesa, de reduzir o tamanho do Estado e outras coisas habituais que por aqui se fala.

Deixei na primeira troca de impressões um desabafo:
Uma tentativa de diminuição gradual [da despesa e do Estado] talvez fosse possível quando Guterres chegou ao poder mas hoje não vejo como isso é possível, não acredito que o país tenha tempo para um corte gradual.

Disse-o convicto e com a naturalidade de quem pensa isto há vários anos e o dá como adquirido mas foi-me, compreensivelmente pedido para elaborar mais sobre o assunto de forma que aqui deixo estas notas soltas.


Portugal está efectivamente falido há mais de uma década e continua a gastar o que não tem. A única razão porque nos mantemos solventes é devido à confiança (no meu entender mal colocada) dos credores estrangeiros que nos continuam a deixar viver a crédito.

Eu estou convencido que a crise financeira ainda vai a meio. Os credores começarão, mais tarde ou mais cedo, a serem selectivos a quem emprestam dinheiro e Portugal é daqueles países que se ninguém nos emprestar dinheiro nós não podemos pagar o que devemos. É como quem vai pedir emprestado à COFIDIS para pagar o empréstimo da casa não apenas pontualmente mas sistematicamente. É difícil acreditar que este comportamento tenha outro destino que não a ruína financeira. Como as últimas notícias mostram os credores (normalmente referidos como especuladores) estão a começar-se a afastar dos países mais perigosos como a Grécia, Portugal e Espanha. Se a situação piorar (como é expectável que piore na minha opinião) estes 3 serão vítimas certas da crise. Fala-se muito de ajuda externa (da UE) o que a meu ver será um erro que pode destruir financeiramente toda a união. Não existem recursos (sem destruir a moeda) para salvar todos os países em dificuldades. Lembro que países como a Itália e a França não estão propriamente saudáveis financeiramente. Se Portugal ou a Grécia forem considerados "demasiado grandes para falhar" o que dizer da Itália? Certamente será "demasiado grande para salvar".

Portugal é um país a prazo, tem uma grave crise económica, o regime político está podre e corrupto de uma forma que (segundo as últimas notícias) parece até ter infiltrado as mais altas instâncias da justiça e prepara-se nos próximos tempos para enfrentar uma crise de liquidez sem precedente ao nível soberano. Para mais o país está refém do que já é praticamente a maioria dos cidadãos que vivem, de uma forma ou de outra, das esmolas do Estado. Sejam funcionários públicos, reformados, agricultores, artistas ou beneficiários dos mais variados subsídios como o de desemprego e RSI. Um poder político fragilizado como este não pode levar a cabo reformas profundas de nada e como tal não haverá tempo.

Viveremos com o fantasma de sermos governados a partir do exterior através da UE ou do FMI que serão imunes aos protestos de quem vive do sistema e tudo farão para recuperar os empréstimos a Portugal. Pior, corremos o risco (porque Portugal não é certamente o único nesta situação) de não termos um governo externo a tomar conta disto e os nossos credores simplesmente cortarem as relações connosco. Consegue imaginar um Portugal em que ninguém nos dá crédito para importações? Consegue imaginar os nossos fornecedores de petróleo, gás e comida a pedirem algo em concreto pelos seus bens em vez de promessas? A Islândia passou brevemente por isso antes da intervenção Russa e do FMI e não foi nada bonito.

Eu consigo imaginar isso tudo, só não consigo imaginar que Portugal será esse. A 1ª República caiu por menos.


Claro que nada disto são certezas, é apenas um educated guess.

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