domingo, 22 de fevereiro de 2009

Unidos por arames

Desde a mais tenra idade que me lembro de ser bastante desconfiado do conceito de União Europeia, foi sempre uma coisa que me fez confusão mas com o tempo fui aprendendo a viver com ela. Faz para mim todo o sentido a CEE (uma união económica para o bem de todos) mas quando me falam em unir politicamente países como a Finlândia e a Grécia fico desconfiado, quando se fala em colocar no mesmo barco o rigor alemão e o desenrasca português parece-me uma receita muito mal conseguida. Por isso não gostei da criação da moeda única e pelas mesmas razões critiquei Maastritch. Criar um novo governo à imagem dos EUA a partir de Bruxelas e à revelia dos cidadãos (como é demonstrado pelos consecutivos referendos adiados cada vez que o povo ameaça chumba-los) não é apenas arrogante, é também uma estupidez.

Esclareço isso para que o leitor compreenda que parto de um preconceito mas que fique claro que o que vou apresentar em baixo é muito mais grave que qualquer ideia pré-concebida: a ideia que esta união está presa por arames e que a crise financeira veio expor as fragilidades da UE.

Nos últimos anos cometeu-se muita loucura no sistema financeiro. Através dos fundos atribuídos pela UE aos países "emergentes" da Europa de leste estes tiveram um crescimento bastante rápido. Mas os fundos não chegam e como tal foi necessário recorrer ao crédito. Em países como a Polónia onde o Banco Central estava comprometido a ter uma moeda estável para mais tarde aderir à moeda única as taxas de juro podiam ser desagradáveis para quem necessitava de crédito, felizmente a criatividade financeira de alguns bancos permitiu que os cidadãos polacos contraíssem dívidas em moeda estrangeira (como euros ou francos suíços) e assim terem acesso a taxas de juro mais baixa. Claro que ninguém se preocupou em fazer o hedge cambial destes empréstimos (o que é certo eliminaria as vantages) e agora que o Zloty polaco caiu praticamente 50% em relação ao franco suíço dificilmente se consegue pagar a prestação (uma vez que a quebra do valor da moeda em metade implica uma prestação do dobro do valor) isto coloca não só problemas à Polónia como aos bancos estrangeiros que lá operavam e concediam estes créditos e também à própria Suíça que se arrisca a nunca ver a cor do dinheiro que emprestou. As alavancagens brutais que se utilizaram na criação destes problemas só vem agravar o problema.

Não se pense que seja um caso isolado, todos nós sabemos que o BCP se expandiu nos últimos anos para a Polónia mas não foi certamente o único. Muitos bancos gregos por exemplo fizeram o mesmo para outros países emergentes na Europa e o Governo de Atenas já lhes pediu para abandonarem essas estratégias expansionistas - um bom conselho se bem que peca por tardio.

Se virmos as declarações recentes dos governantes europeus nos últimos dias vemos, sem margem para duvidas, que os problemas são muito graves. A Grécia admitiu estar com dificuldades em fazer face aos seus compromissos no exterior, a Irlanda foi obrigada a reduzir o salário dos seus funcionários públicos, a Itália pediu ao BCE a criação de um mercado de obrigações europeus para que fosse possível imprimir notas descaradamente (algo que o BCE está limitado pelos seus estatutos) como se tem feito nos EUA, em Espanha a bolha imobiliária foi provavelmente a maior de toda a Europa e o país ressente-se. Apenas em Portugal temos um ileterado financeiro a governar o país que ainda acha que vai ter financiamento para brincar aos comboios e construir aeroportos.

Os problemas de financiamento destes países está bem patente nos gráficos em baixo para a Irlanda e para a Grécia (fonte).




Em baixo está um gráfico da BCA Research que mostra o risco associado a cada país europeu (alguns fora e outros dentro da zona da moeda única) como se pode ver existem países, particularmente a Irlanda e Portugal, muito próximos do nível da Islândia - um país que, lembro, está tecnicamente falido.



Qualquer um destes países está sujeito a um "evento negro" que pode despoletar um efeito em cascata suficiente para falir um Estado independente. Em Portugal, por exemplo, a falência do BCP seria um evento desse tipo (não estou a dizer que vai acontecer, é uma possibilidade, e para valer 0 já só faltam 65 cêntimos por acção) e noutros países será a mesma situação. Quando nos EUA se fala em bancos que são "grandes demais para falhar" em alguns países mais pobres da UE alguns bancos serão "grandes demais para salvar" porque simplesmente o Estado não terá dinheiro suficiente para cobrir o buraco.

Um evento deste tipo terá obviamente repercussões no resto da UE e a acontecer os líderes de outros países terão que decidir o que fazer. Colocar em funcionamento as impressoras do BCE ou não - prejudicando todos. Devem os estados mais fortes socorrer aos mais fracos ou deixá-los cair? E vão os eleitores alemães suportar a compra de bancos gregos ou irlandeses sem protestar? E de que serve uma união se não há entre-ajuda? Os líderes políticos terão de se confrontar com a realidade: não há um sentimento de união entre os cidadãos da Noruega e da Itália e cada um que resolva os seus problemas (como fez a Irlanda quando sem avisar ninguém garantiu a 100% todos os depósitos dos bancos irlandeses prejudicando países como a Alemanha e a França mas que foi uma medida de emergência necessária que impossibilitou a fuga de capitais para o estrangeiro que estava a acontecer na ilha).

Não é pois de admirar as variações brutais que têm havido na moeda única europeia. Os investidores estão indecisos para onde fugir e na Europa temem o fim da moeda única enquanto cada país volta à sua moeda ou até que as propostas italianas sejam colocadas em prática desvalorizando em muito a moeda. Por outro lado o USD não está livre de problemas o que está a levar a fuga para o ouro (recomendação feita aqui inúmeras vezes) que nos últimos 6 meses já valorizou, em euros, mais de 40% e que tem feito, dia atrás de dia, máximos históricos.



A crise pode ter sido iniciada nos EUA mas não é de descartar a hipótese que as primeiras vítimas estejam do outro lado do Atlântico.

3 comentários:

Tino disse...

Eu também não acredito na UE e será um dia feliz aquele em que acabar.

Mas olha que a Noruega não faz parte da UE. Eles não se deixaram iludir com a prantanha da União, logo que viram que iam perder o controlo sobre as pescas.

Nuno Branco disse...

Tem toda a razão, mania de dar o exemplo dos nórdicos :)

De qualquer das formas o raciocinio seria o mesmo para a Suécia ou Finlândia.

Anónimo disse...

A UE há muito que estava condenadae o Euro foi oúltimo prego no seu caixão.