segunda-feira, 7 de junho de 2010

Não se pode ir de férias

Uma pessoa já não pode ir de férias descansada. Tira-se um pequeno dia para descansar e de repente a Hungria proclama estar à beira da falência (e tu BCP, quanto lá tens metido desta vez?), o Euro quebra suportes fazendo novos mínimos relativos, os tribunais alemães ameaçam vetar o bailout europeu por este ser anticonstitucional e, como cereja em cima do bolo, o presidente da república portuguesa pede-me para passar férias no Algarve a bem da economia e contra o endividamento externo. Alega em tom solene que sabe muito bem do que fala, não fosse ele economista.

Não é, no entanto, de espantar. Se é verdade (como diria Edward Murrow) que uma nação de ovelhas origina um governo de lobos também não é menos verdade que um país de trampa pede um presidente da mesma qualidade. Cavaco termina o seu primeiro mandato (quem sabe o último) caracterizado pelo silêncio em temas de somenos importância envolvendo o Governo e a comunicação social mas demonstrando-se sempre pronto a falar de assuntos de interesse nacional como o meu destino de férias ou sobre se a maricagem pode ou não entregar o IRS junto se tiverem um anel no dedo. Eu que sou um bocado “poucochinho” gostaria que o Sr. Presidente me explicasse melhor esta história. Como é que eu, com 1000€ no bolso para gastar estou a endividar a nação por decidir passar as minhas férias na Riviera Maya? E o que acontece se um português pedir um empréstimo ao estrangeiro para passar uns dias na Madeira (que fica mais caro que a Riviera Maya) ?

Eu compreenderia que o nosso presidente viesse dizer que os portugueses não se devem endividar para passar férias, algo que é do senso comum. Já dizia a minha mãezinha que “quem não tem dinheiro não tem vícios” (excepto se for o Estado e poder gastar o dinheiro dos outros) mas não foi isso que o presidente me pediu, fiquei aliás com a sensação que desde que seja para passar férias em Portugal não faz mal nenhum ir à banca – até pode ser um banco de estrangeiro. Ou seja, a preocupação do Sr. Presidente não tem nada a ver com a dívida (como é fácil de ver, senão estaria mais preocupado com o que o Governo anda a fazer do que como vou gastar os meus trocos das férias) mas sim com o proteccionismo do turismo local, nada mais do que isso. Não é preciso ser economista para falar destas coisas, basta ter vontade de mandar na vida dos outros.

Mas se o Sr. Presidente sabe tanto do que fala e está tão convencido da sua razão porque não convoca Sócrates e pede para que legisle no sentido de proibir férias no estrangeiro? Poderá ser anti-constitucional mas justificado pelos tempos de crise em que vivemos, aliás é uma medida muito menos radical do que, por exemplo, subir os impostos com efeitos retroactivos. Se o Tribunal Constitucional pode fechar os olhos a isso devido à crise também pode fechar fronteiras. E porquê ficar por aqui Sr. Presidente? Isto é algo que só resolve o problema durante os meses de verão, uma preocupação destas com as nossas importações não se pode limitar a um quarto do ano, a crise é profunda e a lógica tem de ser seguida com convicção se queremos salvar a nação. Porque não propor medidas como estas:

1) Proibir os portugueses de andarem de carro mais que 10 mil Km por ano. As importações de petróleo são muito más.
2) Obrigar os portugueses a tomar banho de água fria. As importações de gás são muito más.
3) Decretar uma refeição por dia como o máximo permitido por lei. As importações de comida são muito más.

E muitas outras leis no mesmo sentido que estou certo o Sr. Presidente, como especialista que é na matéria, tem já colocadas na manga. Não se esqueça claro de expropriar qualquer macaco com dinheiro no bolso não vão os tipos furar leis tão justas e endividar a nação. Porque todos sabemos que não existem indivíduos, existe apenas a nação e se alguém importa não interessa se pagou ou ficou a dever, é para abater.

Depois de abatidos os macacos e de termos terminado com as importações só queria saber uma coisa que me escapa no seu pensamento: Quem é que vai exportar e para onde?

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