sexta-feira, 25 de junho de 2010

Ponto de não retorno

Este gráfico que aqui coloco em baixo já a grande parte dos leitores conhece uma vez que tem sido actualizado ao longo do tempo no Inflaccionista. Mede o diferencial de taxas de juro, pagas a 10 anos, entre vários estados (países?) e a Alemanha que serve normalmente como benchmark para a zona euro.



Como tive oportunidade de dizer na última análise, se suavizarmos a linha com uma média mensal dos spreads nota-se claramente que a tendência é para estes spreads continuarem a aumentar. O que não notamos é qualquer impacto positivo (do ponto de vista do custo de endividamento do Estado) das várias medidas tomadas pela União Europeia para ajudar os países conhecidos como PIIGS. Neste outro gráfico que coloco, das taxas de juro brutas a 10 anos, a situação é basicamente a mesma:




Como se pode ver, houve um breve declínio das taxas de juro em Março quando vieram as intervenções no mercado mas como quem me lê está farto de saber as intervenções no mercado não resolvem nada de fundo além de normalmente criarem problemas novos. Assim, como se pode ver Portugal, Espanha, Irlanda e Grécia pagam hoje mais juros do que faziam em Fevereiro antes das intervenções europeias. De facto, países como a Alemanha e Holanda são dos poucos que pagam hoje menos do que há quatro meses atrás exacerbando ainda mais a diferença entre os vários estados membros.

A outra coisa que me salta à vista quando olho para este gráfico e que queria partilhar é o que determino por “ponto de não retorno” e grosso modo está, no segundo gráfico, traçado na linha de 6%. No período de tempo que a maioria da população entende como sendo “o pior da crise” que vai de Setembro de 2008 a Março de 2009 houve vários países que se aproximaram dos 6% mas voltaram atrás e a vida parecia ter retomado o seu percurso normal. Falou-se obviamente do problema da Grécia mas na altura Portugal, Espanha e Irlanda eram “diferentes” e “não tinham nada a ver com a Grécia”. A Grécia claro, todos sabemos, não teria qualquer necessidade de ajuda externa da UE e muito menos do FMI. É quando passa os 6% que o mercado fica convencido que por aqueles lados a coisa correu mal, nunca mais as taxas voltam abaixo deste valor e quando entramos em valores acima de 7% a UE é obrigada a intervir (já que não quis que houvesse default).

Estes valores não são aleatórios, é sabido que grande parte dos cortes orçamentais na Grécia estavam a ser consumidos pelo aumento dos juros. Em Portugal, apesar de não haver cortes orçamentais dignos desse nome o aumento dos juros está já a levar o Estado a procurar financiamento a prazos mais curtos como 3 e 5 anos (algo que também a Grécia fez quando se começou a aproximar dos 6%) mas claro que isso não resolve nada.

O que quero dizer com isto tudo? Que caso os juros da dívida portuguesa a 10 anos passem os 6% preparem-se: a seguir o mundo vai mudar novamente em 15 dias e o engenheiro terá que começar finalmente com cortes orçamentais que se vejam. Seremos os primeiros a recorrer ao super-fundo europeu e os segundos a tornarmo-nos um protectorado alemão como os federalistas do bloco central sempre sonharam. Vai ser penoso porque cada vez que adiamos a dor da responsabilidade financeira tem um custo: maior dor no futuro. Pois o futuro chegou e está para durar… pelo menos até a Espanha também passar o “ponto de não retorno”. Aí, o mundo irá mudar em 15 minutos.

2 comentários:

Sérgio disse...

É curioso ver que a Irlanda está coladinha a Portugal, apesar de aparentemente ter feito cortes orçamentais mais sérios do que nós por cá...
Parece que a Europa como conhecemos está mesmo a ir pelo cano abaixo.

Nuno Branco disse...

A Irlanda partiu de uma posição pior. O problema deles é um problema bancário/financeiro.

Nós temos um problema estrutural.