terça-feira, 28 de outubro de 2008

Premonições de uma crise anunciada

Manuel Alegre teve “premonições” desta crise financeira. Segundo o próprio já por duas vezes, em 1999 e 2004, tinha alertado o PS (em congresso interno) de que a “falta de regulamentação” e os “excessos dos mercados financeiros” dariam nesta crise que hoje enfrentamos. Junte-se ao clube, não conheço nem um único liberal (daqueles que acreditam nos mercados livres, não dos que acreditam nos livres quando sobem e nos governos quando o mercado desce) de mercado que não tenha previsto esta crise. Não conheço nenhum capitalista (daqueles que acreditam que o capital é uma força mobilizadora da economia e não aqueles da banca que acreditam que promessas de capital futuro é a mesma coisa que capital real) que não tenha alertado para as origens desta crise no nosso actual sistema monetário.

É aliás a grande diferença entre os que choram pelo Estado e aqueles que acreditam nos mercados. É que uns chamam-lhe crise financeira e os outros chamam-lhe crise monetária, coisas bem distintas. Tal como as crises identificadas são distintas também as soluções são distintas bastando ver algumas propostas de ambos os lados.

Solução proposta por liberais para uma crise monetária:
- Deixar as empresas (incluindo bancos) insolventes falharem
- Deixar o mercado agir naturalmente no seu processo de descoberta de preço justo
- Pagar a dívida (dos privados e dos Estados)
- Terminar ou reduzir os sistemas de reserva fraccional que exponenciam a criação de crédito
- Voltar a devolver valor ao dinheiro através de um padrão ouro ou de uma qualquer moeda que tenha ligação a bens físicos (além do papel em que são imprimidas)
- Terminar com os Bancos Centrais e com o monopólio que eles têm sobre as taxas de juro, é reconhecido pela maior parte dos economistas liberais que a crise actual está em parte ligada às baixas taxas de juro que como se sabe são reguladas pelos Bancos Centrais e Governos e não pelo mercado (apesar de se apontar frequentemente o dedo ao mercado como culpado de tudo).

Solução proposta por estadistas para uma crise financeira:
- Regulamentar os mercados (ninguém diz muito bem como mas será que o Estado vai passar a determinar quanto é que alguém pode pedir emprestado?)
- Criação de novas instituições internacionais ou dar novos poderes ao FMI e ao Banco Mundial (qualquer pessoa informada sabe bem as consequências que as politicas do FMI tiveram em países em desenvolvimento como a Indonésia, Argentina e Etiópia entre outros… é a esta gente que queremos dar mais poder?)
- Endividar mais o Estado para lançar grandes projectos de investimento (aeroportos, TGVs, etc. – se ambos os lados reconhecem que o excesso de crédito nos privados esteve relacionado com a crise não percebo como os estadistas pensam resolver o problema com excesso de crédito pelo Estado)
- Dar emprego às pessoas, Sarkozy anunciou hoje que vai dar emprego a 100 mil franceses (não explicou para que são estas pessoas ou que empregos lhes vai dar, mais uma vez interfere com o mercado de emprego criando oferta artificial. Qualquer livro de economia ensina quais são as consequências deste tipo de movimentos mas infelizmente para se ser presidente da UE não é preciso saber ler)
- Comprar empresas falidas para garantir os mercados de crédito (sem comentários…)
- Quando os bancos se recusam a emprestar dinheiro o Estado empresta directamente às empresas (através de divida do Estado)

São, mais ou menos, estas duas propostas que estão em discussão, a primeira que passa em muitos pontos completamente despercebida e sem nenhum tempo de antena na comunicação social e a segunda que todos os dias nos invade as nossas salas de jantar com Manuel Alegre, Sócrates, Sarkozy, Barroso, Gordon Brown e Bush (ou Paulson) sempre a bater na mesma tecla. O problema para eles é que o mercado de derivados não foi regulamentado… mais uma vez digo que esse é apenas um sintoma e não a causa. Se não tivesse sido permitido este sistema monetário bárbaro de papel-moeda nunca teria sido possível montar esses mercados, nunca teria sido possível multiplicar o crédito a estes níveis e nunca teríamos envolvidos num décimo da trapalhada em que estamos neste momento.

Assim, lá seguimos nós contentes e felizes para a regulamentação que a URSS já demonstrou (da maneira mais problemática) que não funciona. Mas Alegre é teimoso e acha que não vale a pena aprender com a História, não vale a pena aprender que regulamentar e planear o mercado causa perca de produtividade (e riqueza obviamente). Não vale a pena aprender que o padrão ouro foi responsável por séculos de prosperidade económica na Europa e que os mercados livres funcionaram quando lhes foi dada a oportunidade (desde o fim do sistema feudal).

Winston Churchill uma vez disse “podemos confiar nos Americanos para tomar a opção correcta… depois de esgotarem todas as outras alternativas”. Penso que podemos extender, hoje, esse pensamento aos Europeus, talvez ao fim de uma ou duas décadas da recessão a que nos condenam decidam fazer o que está certo e corrigir a raiz do problema: um sistema monetário insano.

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